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terça-feira, 9 de maio de 2017
FELICILÂNDIA
Na cidade de Felicilândia localizada no
nordeste brasileiro o prefeito através de plebiscito propôs eliminar um
sentimento humano: a tristeza. Quando a lei foi aprovada os otimistas saíram às
ruas para comemorar. Em contrapartida os depressivos, ou pelo menos alguns
deles, saíram às ruas para demonstrarem sua insatisfação com a nova lei.
Os argumentos a favor da lei diziam
mais ou menos o seguinte: “A tristeza já é um sentimento obsoleto para os seres
humanos. A tristeza torna o homem débil, confuso, frágil. Não fazemos nada
quando estamos tristes, o otimismo e a alegria é quem verdadeiramente movem as
boas ações. ” E como não podiam ficar de fora os depressivos rebatiam: “A
tristeza torna o homem mais humilde. A tristeza possibilita ao homem refletir
sobre suas próprias ações. Como poderíamos reparar os criminosos se
proibíssemos de manifestarem a tristeza de um arrependimento pelo crime cometido?
”.
Após meses de intensa discordância
entres os grupos a favor e contra, a lei foi sendo absorvida lentamente pela
sociedade. Nas ruas os Patrulheiros da Alegria aplicavam multas altíssimas a
menor suspeita de tristeza. O governo criou até o chamado Disque Tristeza (cujo
número era 187-478-392), foram várias denúncias de vizinhos incomodados pela
tristeza alheia.
Depois de um ano de aplicação o governo
da alegria, encomendou ao IBGA (Índice Brasileiro de Geografia e Alegria) que
levantassem os índices da população para avaliarem como a sociedade lidou com a
nova lei. O resultado não poderia ser mais animador, os índices de
criminalidade caíram em 90%, 90% dos presos estavam sendo liberados por bom
comportamento, os níveis de depressão reduziram 90% e os índices educacionais
aumentaram 90%.
O atual presidente dos Estados Unidos, Mark
Zuckerberg, enviou os melhores pesquisadores da Universidade de Harvard, Stanford
e várias para estudarem o fenômeno. Enviou antropólogos, psicólogos,
psiquiatras, engenheiros sociais e pessoas de confiança para prepararem um incrível
relatório sobre a cidade de Felicilândia.
O relatório encomendado pelos E.U.A
rendeu vários anos com pesquisas em campo, entrevista com o prefeito de
Felicilândia e os políticos que aprovaram a lei que proibia a tristeza. O
relatório finalmente foi entregue a Casa Branca e numa reunião Zuckerberg não
acreditou nos resultados. De uma maneira simplificada e extremamente reduzida
os dados demonstravam a seguinte conclusão: “Declaramos que de fato os dados
apresentados pelo governo brasileiro relativos a redução da criminalidade,
menores índices de depressão, melhoria educacional, dentre outros são legítimos.
O relatório, porém, torna-se inconcludente quando analisa a proibição de um
sentimento tão importante quanto a tristeza e suas aplicações nas relações
interpessoais. Não sabemos o motivo de tanto sucesso de uma lei como essa. ”.
Passaram-se uma década e o antigo
prefeito de Felicilândia tornou-se presidente do Brasil. Com o slogan de sua
campanha “Eliminando a tristeza melhoraremos o Brasil”, atraiu muitos fãs
anônimos e influentes que lhe apoiaram e possibilitaram a aplicação da lei em
nível nacional.
Nessa altura o atual presidente, Elon
Musk, incentivou a criação de microchips implantáveis para eliminação neural da
tristeza. O que dentro de pouco tempo tornou-se um fracasso absoluto, pois as
pessoas começaram a largar empregos, família para simplesmente aproveitar a
vida. O índice de criminalidade aumentou absurdamente, pois não existia mais
remorso dentre a população.
Os E.U.A em decadência deixou de ser a
maior potência do mundo dando espaço a nação brasileira. O Brasil tornou-se os
Estados Alegres do Brasil e o português em pouco tempo tornou-se a língua mais
falada do planeta, nas escolas de todo o mundo o português era o segundo idioma
ensinado. Os filmes de hollywood perderam popularidade e as novelas brasileiras
tornaram-se famosas no mundo inteiro.
Nem os mais conceituados pesquisadores
puderam afirmar com exatidão o que fez os Estados Alegres do Brasil sair de um
país emergente para uma potência mundial. As grandes potências Ocidentais e
Orientais tentaram aplicar as suas leis de proibição a tristeza, mas nenhuma
delas obtiveram grandes avanços como no Brasil.
O presidente dos Estados Alegres do
Brasil governou até o último dia de sua vida, porém a população brasileira não
o viam como um ditador. O país passou a idolatrá-lo como líder nato e salvador
da pátria e o dia de sua morte tornou-se um importante feriado, talvez mais
representativo do que o dia da independência.
Anos depois da morte do presidente foi
anunciado pelos E.U.A um documento escrito de próprio punho pelo líder e salvador
brasileiro. Documento que foi desacreditado pela nação brasileira e creditado
como “inveja norte americana. ” Eu, porém, ao contrário de tantas pessoas,
posso afirmar que de fato o documento é verdadeiro.
Meu pai deu-me secretamente um bilhete
escrito com letra trêmula antes de morrer dizendo-me: “Faça o que julgar
acertado com este escrito. Aqui escrevo a minha verdade. ” Divulguei o escrito e
fui condenado como “inimigo imperdoável” da pátria, fui exilado e atualmente
moro nos E.U.A. onde trabalho como terapeuta voluntário da associação de jovens
infratores na igreja e vendedor de pipoca. Apesar de tudo tenho uma vida
bastante feliz. Deixo a quem interessar as últimas palavras de meu pai, o
presidente e salvador da pátria brasileira:
“ Alguns
dizem que eu salvei meu país, chamam-me de gênio, líder nato, intelectual. Porém
devo dizer que nada disso me considero. Minha esperteza, porém, vem do meu
discurso cativante e salvífico. Eu fiz todos crerem numa grande e bem contada
MENTIRA! Discursei para multidões desesperadas que de tanto aprenderem a
desacreditar acreditaram numa mentira boba; a, de que é possível viver sem
tristeza. Nosso povo continua triste, a saúde continua péssima, a educação
piorou, apesar de termos a melhor economia, mas para os tolos o que vale são
apenas os dados ou quais divulgamos para o mundo. Sonho com o dia que todos se
darão conta de que estão agindo como marionetes e que a tristeza apesar de
proibida está fortemente impregnada na nossa sociedade. Mesmo aprovando uma lei
que proibia a tristeza é ela que me motiva a escrever estas últimas palavras. “
De:
Jorge Feitosa Emanuel Silva
Para:
Meu filho e a todos os tolos que em mim acreditaram.
FIM
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