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quinta-feira, 20 de abril de 2017

A Concha (Parte 01)



Caderneta 01:

18/abril
Não se sabe ao certo como vieram parar aqui, sabem apenas que aqui estamos. A concha é um lugar isolado e misterioso, traz consigo marcas de um conflito desconhecido ameaçado por criaturas monstruosas e letais. Todos vestem branco, pois é a única opção de roupa que se tem. Não temos nomes apenas números, não temos muitos sonhos, mas se lhe concedessem um desejo escolheríamos conhecer o mundo além da concha.

22/abril
Eu me chamo 20895-B, mas alguns me conhecem por 2-B acordei há cinco anos atrás e desde então tento entender este lugar. Assim como todos aqui não conheço minhas origens, vou levando a vida (ou o que pode se chamar de vida) em busca do grande portão.
23/abril
Este é meu caderninho de anotações que consegui com muito sacrifício trabalhando com os generais, que são como nós, apesar de não quererem ser. “O caminho”, nossos “líderes” parecem ter um interesse especial nas nossas anotações ou pelo menos penso isso, pois não existe nenhuma proibição em escrever durante os dias aqui.
03/maio
Me pergunto se eu fui um escritor famoso fora da concha, porque eu me sinto mais livre quando eu escrevo. Abstraio durante alguns momentos e posso imaginar como é o mundo livre das criaturas.
06/maio
Algo muito importante que eu ainda não citei é o valor das palavras. Nossas palavras são contadas, temos um total de dez por dia. Ninguém sabe o motivo de serem dez palavras, apesar de haverem muitas teorias que deixarei de fora desta anotação.
08/maio
Aqui as pessoas podem se relacionar, conheci um casal que teve um filho, o que eu acho loucura. Quem em sã consciência poria um filho neste mundo?!  Eu não. Apesar disso 4-C e 2-A são ótimos, os conheci numa caçada a aranha da montanha. Quase morri, mas 4-C me salvou em tempo de ser esmagado por suas patas gigantes. 2-A proferiu o último golpe e derrubou o bicho. Desde então me relaciono com eles e nos protegemos.
12/maio
Muitas pessoas enlouquecem aqui, não aguentam o fardo e eu as entendo ao invés de julgá-las. É uma vida muito dura e injusta e constantemente em nossa mente vem o desespero de permanecer aqui para sempre. Mas alguns poucos dizem que há esperança, e alguns afirmam que já conheceram um libertado. Será que algum dia eu serei um libertado?
14/maio
Eu vi uma moça hoje no campo de plantação, ela era muito bonita. Eu geralmente não me aproximo de estranhos, mas uma vez na vida resolvi interagir. Ela foi agradável, até sorriu para mim e eu retribuí. Nos olhamos por alguns minutos e percebi que seus olhos eram lindos. Espero encontra-la novamente.
21/maio
4-C me convidou para ir atrás de um carregamento que caíra na floresta. No início eu fiquei relutante, pois tínhamos ração o suficiente para três dias. Mas ele insistiu dizendo que talvez houvessem algumas canetas. Prontamente eu fui com ele. Enfrentamos alguns touros raivosos sem grande problema. Conseguimos algumas latas de ração de porco e duas canetas. Tirando o porco a recompensa foi satisfatória.
23/maio
2-A estava preocupada, pois seu filho pequeno N estava doente, estava quente e não conseguia sair da cama. 4-C foi atrás de algumas plantas na floresta e preparou um chá. N ainda está se recuperando, mas já está melhor. N têm sorte, pois têm 2-A e 4-C. Na concha poucas pessoas se importam verdadeiramente com você.
30/maio
Fiquei curioso, pois hoje vi um grupo de sete pessoas perto do campo, eles me convidaram usando suas palavras: “Vamos achar um? ” Eu não entendi por que eles gastaram suas palavras assim. Mas seria rude não os responder com palavras também: “Obrigado eu tenho família. ” Eles compreenderam e agradecerem com gestos. Um é o primeiro morador, dizem que ele possui mais conhecimentos do que todos. Algumas pessoas arriscam a vida para encontra-lo eu não acredito que ele ainda esteja vivo, a concha deve ter milhares de anos.
07/junho
Passei o dia procurando pela moça que eu encontrei a uns dias atrás no campo de trabalho. Não a encontrei. Tive um sonho esquisito com ela, é estranho, porque só a vi uma vez na vida. Sonhei que estávamos de mãos dadas olhando o rio, parecia um lugar diferente da concha. Deitamo-nos no chão e começamos a olhar para cima, não víamos a estrutura de metal que reveste a concha, mas algo mais profundo que eu não pude identificar, era apenas escuridão, mas no sonho era como se estivéssemos vendo a coisa mais linda do mundo. Foi apenas um sonho, infelizmente.
09/junho
4-C me pediu que ensinasse N a caçar pequenos monstros. N é esquisito, não que exista alguém que não seja esquisito neste lugar, mas ele é mais introspectivo do que todos os outros. Não gesticula bem e ás vezes quando sua mãe gasta algumas palavras com ele parece ter dificuldade em entender. Não se pode culpá-lo afinal esse mundo não foi feito para crianças, a maioria de nós veio parar aqui já adulto.


20/junho
4-C conseguiu uma nova lança num carregamento que caiu na estrada, disse que estava pescando quando viu o balão se aproximando. Parece mais robusta e será uma importante ferramenta para enfrentar os monstros. Ele me deu seu antigo arco e eu estou muito feliz com isso. N pôde ficar com meu escudo e minha espada, ele não parece muito animado com o presente.
(Continua)

 PS: Este conto surgiu de um sonho que eu tive a poucos dias atrás. Nele eu via várias pessoas vestidas de branco ou qualquer outra cor, pois estava sonhando e não sei bem o que vi. Algumas pessoas estavam trabalhando e percebi que existiam ruas em ruínas e prédios abandonados. Acordei empolgado para escrever sobre, mas um sonho é algo muito confuso e tive que criar a maior parte do texto com base em qualquer coisa que eu tenho visto na vida, pois é assim que eu escrevo. O que me chamou atenção no sonho é que algumas pessoas tinham diferentes etnias e nem todos falavam a mesma língua apesar de viverem no mesmo local. Preciso desenvolver e acrescentar este fato na história que acho importante. Já pensei num final para a história, mas espero chegar até o final dela haha!